Ao longo do mês de Dezembro destacamos um disco por dia. Novidades 2020, reedições ou, até, edições de anos anteriores. A essência é que seja um disco com significado para nós ao longo dos últimos meses. Num ano atípico para todos, mas também num período de grande mudança para a Flur.
Eis o que se passa: é fácil nestas alturas do ano perdermos o gosto para os discos que surgem e ressurgem nas listas, pela forma de consenso que se cria a ideia de "melhor". Consenso e consenso e existem muitas formas de consenso, o que não existem é muitos discos como "Vest". Não sei se ouviremos mais falar das Mermaid Chunky, se alguma vez terão uma carreira. Mas raios, "Vest" é como se as ESG tivessem estado em estúdio com os This Heat, com os Flying Lizards a segredarem umas dicas. Brilhante. Este é daqueles discos do qual somos obrigados a fugir da missão e não ter qualquer história a contar de 2020. Ouvimos isto em setembro, ficámos rendidos, absorvidos, apaixonados. Talvez isso diga algo de 2020.
"É quase uma tradição britânica, músicos que têm uma formação mais clássica alinharem por formas transformativas da pop. Na última década tem havido casos sonantes, como de Mica Levi ou Tirzah. A elas junta-se Freya Tate e Moina Leahy, um duo de Stroud, Gloucestershire, as Mermaid Chunky. Há aqui pós-punk, improvisação, música que se ouve como parte de uma performance, que tenta contar histórias de um quotidiano imaginário, entre amizades e um mundo que só existe em “Vest”, na concretização deste som e desta existência. Tudo aquilo a que podemos comparar as Mermaid Chunky parecerá um exagero: os Animal Collective do início? Mica Levi quando criava a pop mais relevante daquela altura com Micachu & The Shapes? ESG revisited? É isso, parece exagero, mas é assim que as Mermaid Chunky soam em “Vest”, um álbum de catarse e de uso sábio da sua formação clássica e de jazz em favor da pop. Parece música a brincar – é música que está a brincar – mas, simultaneamente, experimental, rica, sem limites e com uma sabedoria enorme em não saber explodir. Contida, portanto, fresca, nova, inocente e rebelde. É como se os 49 Americans tivessem renascido em Freya e Moina, mas com a precisão de saberem comunicar lindamente para o século XXI. Essencial. Uma bomba de cores. E detestável dizer que este é o grande disco de 2020 que vocês não conhecem. É condescendente e parvo. É daquelas coisas que odiamos no jornalismo. Mas isto não é jornalismo e falamos sempre a sério. Oiçam. É incrível."