Ao longo do mês de Dezembro destacamos um disco por dia. Novidades 2020, reedições ou, até, edições de anos anteriores. A essência é que seja um disco com significado para nós ao longo dos últimos meses. Num ano atípico para todos, mas também num período de grande mudança para a Flur.
Respirar. Não um, mas três discos no universo de Kaitlyn Aurelia Smith. Involuntariamente, a compositora norte-americana foi-nos deixando indicações para aprendermos a desacelerar num mundo que estava a desacelerar.
Na editora de Kaitlyn Aurelia Smith, uma compilação que pega na ideia simples de respiração e do seu ritmo natural para reflectir sobre padrões rítmicos tão antigos quanto a vida humana e, a partir daí, entregar a construção de fantasias a diversos criadores.
15 faixas de ambientalismo, às vezes falso (apenas porque é mais presente e requer mais atenção ao detalhe), estendem um autêntico tapete fofo que tanto reflecte as ousadas manobras freak dos 70s como algo que ainda está para acontecer no futuro mas que não se consegue prender apenas Lá.
Quando “Tides” foi gravado, ainda se estava algo longe de conhecer o furacão Kaitlyn Aurelia Smith. Gravado em 2013, editado digitalmente no ano seguinte – foi em 2015 que ficámos rendidos com “Euclid” -, “Tides” nasce com uma componente privada, revelada no título para a sua edição em vinil.
Música que Aurelia Smith usava para as suas aulas de ioga. Música meditativa? Talvez. Vale a pensa descontextualizar, ou melhor, desmaterializar a alusão e ilusão do ioga e pensar “Tides” como uma viagem pela música modular – é tudo gravado num Buchla Music Easel – que transporta o ouvinte para as eloquências das explorações new age de algumas compositoras no final da década de 1970 e 1980 e, sobretudo, para o kosmische bucólico.
Mais do que encaixar num propósito, “Tides” é um arco de inocência de uma compositora que estava no caminho para dar um abanão na electrónica-pop nos anos seguintes. Não é “over the top” como os álbuns - “EARS” ou “The Kid” -, e, sim, um desenho completo por onde a compositora pintou por cima nos seus álbuns posteriores. Música de base que é muito completa.
Calma e distinta para tirar o melhor dos dias. A paz. Música que – realmente – importa.
“The Mosaic Of Transformation” reencontra as origens aprensertadas em "Tides". Não necessariamente o que se ouve em “Tides” mas, talvez, aquilo que não se ouvia em “The Kid”, um disco com um salto gigante em relação àquilo que Kaitlyn tinha mostrado até então.
“The Mosaic Of Transformation” torna as viagens oblíquas do passado – “Euclid” e, sobretudo, “EARS” – em belíssimas planícies de relaxamento electrónico. Em que dá para alhear da espiritualidade – se se quiser – e aceitar estes belíssimos quadros sonoros em constante mutação.
Nunca soa ao mesmo duas vezes.