A Revolução antes da Revolução
Luís de Freitas Branco
O livro assenta na ideia, bem sustentada, de que 1971 foi um ano fulcral para a música popular portuguesa. Ano de mudança, de revelações, de elementos a serem colocados em movimento e que já antecipavam o 25 de Abril. Enquanto espinha dorsal da ideia, três álbuns fundamentais foram gravados nesse ano: "Os Sobreviventes" (Sérgio Godinho), "Cantigas do Maio" (José Afonso), "Mudam-se Os Tempos, Mudam-se As Vontades" (José Mário Branco). Todos gravados em Paris, em exílio, recebidos com aclamação e polémica em Portugal, tão insuflado com as possibilidades que esta música sugeria como despeitado por terem sido premiados discos gravados por "estrangeirados" quando por cá se mantinham outras vozes meritórias (e, em alguns casos, foram mesmo essas vozes que em ressabiamento se insurgiram). Luís de Freitas Branco percorre os doze meses de 1971 com critério e minúcia, desde a resistência da velha guarda a outras melodias e temáticas na canção popular até ao Cascais Jazz, em Novembro, ter despertado consciências. Nesse mesmo ano saem outros discos fulcrais: "Movimento Perpétuo" (Carlos Paredes) e "Gente De Aqui E De Agora" (Adriano Correia de Oliveira). O autor entrelaça histórias e percursos mais particulares de alguns artistas com os factos recolhidos em testemunho ou na imprensa, demonstrando as forças contrárias que se debatiam entre imobilismo e mudança. O acrescento na censura imposta pelo Regime, no ano seguinte de 1972, significou exame prévio de letras de canções antes mesmo de serem gravadas. A esse ponto extra de repressão não são estranhos os discos referidos e outras artes como a escrita fogosa de Ary dos Santos, protagonista do Festival da Canção desse ano tanto ou mais do que as canções que veicularam os seus textos. Livro iluminador e agitador da (nossa) consciência.