Belzebu
Telectu
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É impossível determinar o impacto que teria, em 1983, a edição de “Belzebu” na primeira versão (depois reconvertida para trilha de fundo do LP colocado no mercado e incluída em CD nesta reedição), como parece ter sido uma primeira intenção de TELECTU. O corte com a realidade musical portuguesa era abrupto e radical (apesar do precedente LP de Anar Band, em 77) e os lamentos do duo sobre “certo empresariado fascistóide” em Portugal seriam certamente mais agudos mas também mais facilmente contextualizados.
Com a versão editada, final, de “Belzebu”, ouvimos o produto de movimentações independentes e marginais, ainda pouco frequentes no país, a tomar forma. Sobre a base imutável de “Belzebu Zero”, remetida a pano de fundo, destacam-se as cinco composições que formam a “primeira obra de música minimal repetitiva em Portugal”. A restante e detalhada explicação técnica pode ser encontrada na folha que acompanha a edição original (reproduzida nesta reedição), em linguagem quase sempre críptica e confrontacional, quase tão importante como a música enquanto mensagem de diferença e iconoclastia.
O arranque nervoso, tenso, com “Rotas”, acontece em duas camadas, uma delas bem presa à terra, suja e arranhada, a outra suspensa, ou elevada, mais etérea, e as duas chocam mas coexistem sempre numa dinâmica de dissonância saudável, questionadora; “Opera” confunde-se mais com o fundo, abandona a componente terrestre e forma um tecido de ambiências que podemos nunca decidir se está mais próximo do Cósmico alemão ou dos minimalistas norte-americanos que Jorge Lima Barreto estudara. A belíssima melodia de cristal comanda a atenção, mesmo sobre a onipresente Drumatix programada no máximo de velocidade; “Tenet” adensa o espírito de “Opera”, sugerindo uma manipulação ritual de pequenos metais, como espanta-espíritos, sujeitos a uma narrativa independente, inescapável, dramática, fuindo até uma eternidade imaginada. Assim se cumpre o lado A. “Arepo” e “Sator”, juntas no lado B, revelam mais explicitamente um caminho futuro para TELECTU, um fio – aqui ainda ténue – de ligação ao jazz, com ritmo e baixo a marcarem um passo mais ou menos autónomo das frases de guitarra circulares, múltiplos efeitos e acontecimentos diminutos captados enquanto se escuta, definidos por um conjunto de decisões perfeitamente anotadas em partitura disponível para qualquer executante que o deseje.